'Mais de um modo de queimar um livro', a lição de Bradbury
Morreu Ray Bradbury. Tinha 91 anos, quatro filhas, era viúvo de uma mulher com quem viveu por mais cinco décadas, ganhou a vida fazendo o que amava e era muito bom no que fazia. É o tipo de morte que se lamenta mais por nós mesmos, que continuamos vivos, mas radicalmente empobrecidos, do que pelo morto. Ao partir, Bradbury não "perdeu" a vida. A vida é que o perdeu. Exemplares de três de seus livros -- O País de Outubro , As Crônicas Marcianas , Os Frutos Dourados do Sol -- desmancharam-se em minhas mãos, de tão lidos, e isso há uns 20 anos. Confesso que, de meados da década de 90 para cá, a obra de Bradbury vem representando uma parcela cada vez menor de minha dieta literária. Muda-se de idade, mudam-se os gostos: a ingenuidade poética que tanto encanta seus leitores mais fiéis a mim passou a soar, cada vez mais, como uma espécie de despropósito. Passei a valorizar e a buscar em minhas leituras uma prosa mais seca, um tipo de enredo mais enxuto, uma narrativa mais obje...