Santo Cristal de Dilítio, capitão!

Temo que os puristas da cultura pop torçam o nariz para o título desta postagem, que mistura dois seriados igualmente populares da década de 60, mas foi inevitável: cientistas anunciam, na revista Nature Physics, terem conseguido manter átomos de antimatéria "vivos" por 1.000 segundos. Isso dá 16,666... minutos, se alguém quiser fazer a conta.

(Aliás, uma dica sobre administração de tempo: 15 minutos são aproximadamente 1% do dia. Pense nisso da próxima vez que alguém lhe pedir para esperar "só uns 15 minutinhos").

Como todo leitor de Marvel, DC ou Dan Brown sabe, partículas de antimatéria aniquilam-se ao entrar em contato com a matéria comum. Isso torna extremamente difícil estudar a antimatéria, que acaba sendo uma versão concreta do paradoxo do solvente universal dos alquimistas: se esse negócio dissolve tudo, em que vasilhame vamos guardá-lo?

No caso da antimatéria, pesquisadores costumam usar armadilhas magnéticas -- campos magnéticos que confinam as partículas num ambiente de vácuo.

O estudo divulgado na Nature Physics dá conta do aprisionamento de 300 átomos de anti-hidrogênio por mais de 16 minutos, um avanço enorme em relação ao último resultado do tipo, que dava conta do aprisionamento de poucas dezenas de átomos por frações de segundo.

O tempo e a quantidade obtidos agora permitirão, dizem os autores do trabalho, estudar a antimatéria com calma e determinar, por exemplo, em que as propriedades do anti-hidrogênio diferem das do hidrogênio.

(Se você está se perguntando, anti-hidrogênio é feito de um pósitron -- uma partícula idêntica ao elétron, mas de carga elétrica positiva -- em órbita de um antipróton, o primo negativo do próton).


Esse estudo, por sua vez, deve trazer algumas respostas sobre o porquê de o Universo conter quantidades de matéria tão enormemente maiores que as de antimatéria. Por algum motivo ainda desconhecido, a matéria comum de que somos feitos parece ser mais estável que sua "irmã gêmea malvada".

Além disso, técnicas cada vez mais refinadas de captura de antimatéria talvez, quem sabe, um dia levem a um método eficiente de usar essas partículas -- e sua interação violenta com a matéria comum -- como fonte de energia ou, ao menos, de propulsão para naves espaciais. Ficam faltando só os cristais de dilítio do título.

Caso mais alguém esteja se perguntando, a aniquilação de antimatéria já foi proposta, seriamente, como um meio de propulsão espacial, na década de 50, pelo alemão Eugen Sänger. Ele propôs um foguete que usasse a aniquilação de elétrons e pósitrons para gerar raios gama, que seriam expelidos da nave, gerando impulso.

O problema desse design, questões de custo e tecnologia à parte, é que seria impossível controlar a direção dos raios gama -- seria como ter um foguete que você não pode apontar na direção oposta à que se deseja ir.

Antiprótons, curiosamente, permitem contornar o problema: a aniquilação próton-antipróton produz partículas dotadas de carga elétrica e que podem, portanto, ser direcionadas por um campo magnético. A ideia de um foguete de antipróton com "bocal supercondutor" foi proposta pelo físico Robert L. Forward ainda na década de 80.

De volta à realidade, assista abaixo um vídeo sobre o experimento:


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