Minerar asteroides? Esses caras estão falando sério?
Confirmando o hype criado no fim da última semana, a companhia Planetary Resources apresentou-se formalmente ao público nesta terça-feira, e anunciou seu objetivo: extrair material de asteroides próximos da Terra. O que nos traz à questão de quem são esses malucos e, depois, às duas perguntas sintetizadas no título desta postagem.
Quanto à identidade: seus cofundadores são dois empresários do setor de turismo espacial, Eric Anderson e Peter Diamandis; entre seus executivos há cientistas e adminsitradores que trabalharam no programa de exploração de Marte da Nasa. Chris Lewicki, o presidente da companhia, foi diretor do voo das missões Spirit e Opportunity. Quem está casando a grana são, entre outros, os caras do Google e Ross Perot Jr., que além de ser um mega-magnata do setor imibiliário, também participou do primeiro voo de helicóptero a dar a volta ao mundo.
Enfim, gente talvez não muito bem equilibrada, mas certamente com um bom faro para negócios. Ao fim e ao cabo, eu vejo dois motivos para duvidar da iniciativa, e uns dois ou três para levá-la a sério. Mas, antes disso, um pouco de história.
Minerar asteroides é uma ideia que remonta (como, basicamente, qualquer ideia sobre exploração espacial que se possa imaginar) ao trabalho do visionário russo Konstantin Tsiolkovsky (1857-1935). Mais recentemente,o caso a favor da proposta foi levantado no livro Mining The Sky , de John S. Lewis. Acho que já recomendei o livro em postagens anteriores do blog mas, enfim, aqui fica a recomendação, de novo.
O argumento geral de Lewis é bem simples: ou voltamos ao neolítico, ou instaura-se um apartheid radical entre ricos e pobres, ou acabamos com o planeta. A única saída desse trilema -- o único modo de garantir que bilhões de pessoas tenham acesso às benesses da civilização sem reduzir a Terra uma cascalheira estéril -- é complementar os recursos naturais do planeta com os do restante do sistema solar.
Asteroides são ótimos para isso: é possível alcançar alguns dos mais próximos de nós gastando menos energia do que a que se consome para enviar uma sonda à Lua, e um único asteroide de tamanho médio contém mais ferro e níquel do que a humanidade já consumiu desde o início da história.
O problema, claro, é que enquanto derrubar florestas e nivelar montanhas para extrair minério do subsolo for mais barato do que desmantelar um asteroide no espaço, o plano jamais será executado. Ou, ao menos, era assim que a coisa estava até hoje.
Falando dos motivos que vejo para levar a Planetary Resources a sério: primeiro e principalmente, o projeto deles não depende de novos veículos lançadores, nem de missões tripuladas. Criar foguetes e lançar astronautas são dois gargalos tecnológicos terríveis (o programa espacial brasileiro, por exemplo, ainda mete os pés pelas mãos quando se trata do primeiro), e ao evitá-los, a companhia mostra prudência e sabedoria.
O segundo motivo é a abordagem gradual que a empresa apresentou. A Planetary diz que pretende começar suas atividades lançando um telescópio orbital, seguido de uma missão para interceptar um asteroide que passe próximo da Terra e, depois, uma outra missão a um asteroide ainda mais distante.
Nenhuma dessas etapas depende de tecnologia radicalmente nova: levar sondas à órbita terrestre, ou a uma altitude de onde seriam capazes de correr atrás de um asteroide, são capacidades que lançadores comerciais disponíveis no mercado já têm. A tecnologia mais radical terá de ser a integrada nas sondas, mas fazer satélites é muito mais fácil do que fazer foguetes (veja-se o caso brasileiro, novamente).
Essa abordagem também permite que a companhia gere (ou tente gerar) receita "no meio do caminho", vendendo tempo de utilização de seu observatório orbital, ou espaço nas sondas para experimentos e instrumentos de governos ou de universidades.
Por fim, o anúncio da Planetary Resources aparece menos de um mês depois deste relatório, elaborado por um think tank de cientistas da Nasa e do Instituto de Tecnologia da Califórnia, dizendo que "chegou a hora" de minerar asteroides. Nós temos a tecnologia, afirma o texto. Só falta vontade.
O plano, do Instituto Keck de Estudos Espaciais, propõe que um asteroide seja "pescado" por uma sonda robótica no espaço e estabilizado em órbita da Lua -- uma vez tendo-o lá, quietinho, poderíamos estudá-lo ou explorá-lo a nosso bel-prazer. O prazo para a captura e estabilização da rocha (de meia tonelada) seria de seis a dez anos, e o custo total da missão, US$ 2,6 bilhões. Isso é o mesmo que a Coca-Cola gastou em publicidade em 2006. O projeto da Planetary Resources não é nem de longe tão ambicioso.
E agora chegamos a meus pontos de desconfiança: primeiro, em nenhuma parte da literatura que encontrei no site da empresa há menção de prazo. Promessas sem data sempre são suspeitas. O segundo é que o mesmo material também não menciona como o asteroide será explorado.
Todas as etapas que constam do site -- observatório orbital, sondagem -- são perfeitamente factíveis com tecnologia atual e bolsos miliardários. Mas, uma vez tendo identificado um asteroide promissor, o que fazer com ele? Qual o custo de fatiar um pedaço de ferro e platina em órbita e trazer esse metal de volta à Terra em segurança (sem, por exemplo, derrubá-lo na cabeça de um pobre beduíno no Saara?). Uma vez com o asteroide certo nas mãos, a Planetary Resources poderá se ver na mesma situação do velho pescador de Hemingway: com um peixe grande demais para o barquinho disponível.
No fim, o verdadeiro plano de negócio parece ser menos minerar asteroides e, mais, vender serviços de observação e sondagem, além de desenvolver tecnologia espacial de ponta que possa ser convertida em spin-offs terráqueos. Mesmo se for só isso, já me parece um grande passo. E então aqui, da pequenez de meu blog, dou as boas vindas e alvíssaras à Planetary Resources.
Quanto à identidade: seus cofundadores são dois empresários do setor de turismo espacial, Eric Anderson e Peter Diamandis; entre seus executivos há cientistas e adminsitradores que trabalharam no programa de exploração de Marte da Nasa. Chris Lewicki, o presidente da companhia, foi diretor do voo das missões Spirit e Opportunity. Quem está casando a grana são, entre outros, os caras do Google e Ross Perot Jr., que além de ser um mega-magnata do setor imibiliário, também participou do primeiro voo de helicóptero a dar a volta ao mundo.
Enfim, gente talvez não muito bem equilibrada, mas certamente com um bom faro para negócios. Ao fim e ao cabo, eu vejo dois motivos para duvidar da iniciativa, e uns dois ou três para levá-la a sério. Mas, antes disso, um pouco de história.
Minerar asteroides é uma ideia que remonta (como, basicamente, qualquer ideia sobre exploração espacial que se possa imaginar) ao trabalho do visionário russo Konstantin Tsiolkovsky (1857-1935). Mais recentemente,o caso a favor da proposta foi levantado no livro Mining The Sky , de John S. Lewis. Acho que já recomendei o livro em postagens anteriores do blog mas, enfim, aqui fica a recomendação, de novo.
O argumento geral de Lewis é bem simples: ou voltamos ao neolítico, ou instaura-se um apartheid radical entre ricos e pobres, ou acabamos com o planeta. A única saída desse trilema -- o único modo de garantir que bilhões de pessoas tenham acesso às benesses da civilização sem reduzir a Terra uma cascalheira estéril -- é complementar os recursos naturais do planeta com os do restante do sistema solar.
Asteroides são ótimos para isso: é possível alcançar alguns dos mais próximos de nós gastando menos energia do que a que se consome para enviar uma sonda à Lua, e um único asteroide de tamanho médio contém mais ferro e níquel do que a humanidade já consumiu desde o início da história.
O problema, claro, é que enquanto derrubar florestas e nivelar montanhas para extrair minério do subsolo for mais barato do que desmantelar um asteroide no espaço, o plano jamais será executado. Ou, ao menos, era assim que a coisa estava até hoje.
Falando dos motivos que vejo para levar a Planetary Resources a sério: primeiro e principalmente, o projeto deles não depende de novos veículos lançadores, nem de missões tripuladas. Criar foguetes e lançar astronautas são dois gargalos tecnológicos terríveis (o programa espacial brasileiro, por exemplo, ainda mete os pés pelas mãos quando se trata do primeiro), e ao evitá-los, a companhia mostra prudência e sabedoria.
O segundo motivo é a abordagem gradual que a empresa apresentou. A Planetary diz que pretende começar suas atividades lançando um telescópio orbital, seguido de uma missão para interceptar um asteroide que passe próximo da Terra e, depois, uma outra missão a um asteroide ainda mais distante.
Nenhuma dessas etapas depende de tecnologia radicalmente nova: levar sondas à órbita terrestre, ou a uma altitude de onde seriam capazes de correr atrás de um asteroide, são capacidades que lançadores comerciais disponíveis no mercado já têm. A tecnologia mais radical terá de ser a integrada nas sondas, mas fazer satélites é muito mais fácil do que fazer foguetes (veja-se o caso brasileiro, novamente).
Essa abordagem também permite que a companhia gere (ou tente gerar) receita "no meio do caminho", vendendo tempo de utilização de seu observatório orbital, ou espaço nas sondas para experimentos e instrumentos de governos ou de universidades.
Por fim, o anúncio da Planetary Resources aparece menos de um mês depois deste relatório, elaborado por um think tank de cientistas da Nasa e do Instituto de Tecnologia da Califórnia, dizendo que "chegou a hora" de minerar asteroides. Nós temos a tecnologia, afirma o texto. Só falta vontade.
O plano, do Instituto Keck de Estudos Espaciais, propõe que um asteroide seja "pescado" por uma sonda robótica no espaço e estabilizado em órbita da Lua -- uma vez tendo-o lá, quietinho, poderíamos estudá-lo ou explorá-lo a nosso bel-prazer. O prazo para a captura e estabilização da rocha (de meia tonelada) seria de seis a dez anos, e o custo total da missão, US$ 2,6 bilhões. Isso é o mesmo que a Coca-Cola gastou em publicidade em 2006. O projeto da Planetary Resources não é nem de longe tão ambicioso.
E agora chegamos a meus pontos de desconfiança: primeiro, em nenhuma parte da literatura que encontrei no site da empresa há menção de prazo. Promessas sem data sempre são suspeitas. O segundo é que o mesmo material também não menciona como o asteroide será explorado.
Todas as etapas que constam do site -- observatório orbital, sondagem -- são perfeitamente factíveis com tecnologia atual e bolsos miliardários. Mas, uma vez tendo identificado um asteroide promissor, o que fazer com ele? Qual o custo de fatiar um pedaço de ferro e platina em órbita e trazer esse metal de volta à Terra em segurança (sem, por exemplo, derrubá-lo na cabeça de um pobre beduíno no Saara?). Uma vez com o asteroide certo nas mãos, a Planetary Resources poderá se ver na mesma situação do velho pescador de Hemingway: com um peixe grande demais para o barquinho disponível.
No fim, o verdadeiro plano de negócio parece ser menos minerar asteroides e, mais, vender serviços de observação e sondagem, além de desenvolver tecnologia espacial de ponta que possa ser convertida em spin-offs terráqueos. Mesmo se for só isso, já me parece um grande passo. E então aqui, da pequenez de meu blog, dou as boas vindas e alvíssaras à Planetary Resources.
A NASA anda ameaçado construir uma estação em um ponto de Lagrange (nem que seja para dar algo para o SLS fazer), o que é o começo da infra necessária. Mas o ponto crucial é, creio, alguma tecnologia de propulsão com impulso específico o suficiente para rebocar o asteroide com uma quantidade razoável de propelente. Alguma versão do NERVA ou do VASIMIR; este me parece ser o principal risco tecnológico da missão, já que nenhum sistema de propulsão não-convencional com um delta-v comparável existe atualmente.
ResponderExcluirO relatório do Insituto Keck diz que dá pra rebocar o asteróide com propulsão irônica, de xenônio. Mas ambém diz que a espera para ele chegar será de anos...
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