Mais alguns correlatos sociais da religiosidade
Semana passada, por conta desta postagem, acabei montando uma planilha no Google Docs com a taxa de religiosidade de mais de uma centena de países, tal como apurada numa pesquisa Gallup feita na segunda metade da década passada, e com as taxas de homicídio intencional desses mesmos países, segundo levantamento do jornal britânico The Guardian. Isso permitiu concluir que os países onde 50%, ou mais, da população considera a religião importante têm, em média, três vezes mais assassinatos que países onde menos de 50% da população leva a religião a sério.
Agora, já tendo organizado a coisa toda desse jeito, me parece uma pena não explorar um pouco mais esses dados, e compará-los a outros: PIB e IDH me pareceram as escolhas óbvias, e é deles que tratarei nesta postagem. Antes, porém, vale a pena citar algumas limitações.
A principal ausência -- são 138 países, ante 187 que costumam aparecer nas listagens de órgãos da ONU -- é o Reino Unido (os números do Guardian, baseados no UN Data, quebram os dados de violência em Escócia, Inglaterra, etc.). Mas suponho que se essa ausência vier a provocar alguma distorção nos resultados gerais, ela provavelmente será a favor da hipótese de que a religiosidade é uma força social para o bem: a taxa de britânicos que considera a religião importante é de meros 26,5%, e o país tem tanto um IDH muito elevado (acima de 0,8) quanto um PIB per capita idem (US$ 36.090, PPP). Na semana passada, eu também ainda não tinha o dado de religião da China, mas encontrei o número no Gallup World View e ele está sendo levado em conta, agora.
Outra questão é a disparidade das datas de coleta dos dados usados: os números da pesquisa Gallup são de 2009 (2011, no caso da China), PIB e IDH são de 2011, os números de homicídio vão de 2003 a 2005. Enfim, uma confusão, mas com exceção dos assassinatos, todas as bases refletem, de algum modo, o mundo pós-crise de 2008.
Enfim, aqui abaixo estão os mapas. O primeiro é o da importância da religião -- porcentagem dos entrevistados de cada país que responderam "sim" à pergunta do Gallup, "a religião é importante na sua vida cotidiana?", e onde "1" corresponde a 100%. Os espaços brancos refletem países sem o dado:
A seguir, a taxa de homicídio por 100.000 habitantes:
Uma análise estatística encontra um coeficiente de correlação de 0,34 entre as duas bases de dados -- religiosidade e violência. Tradicionalmente, isso seria interpretado como uma correlação fraca entre as duas variáveis, indicando que quando uma tem valor alto, a outra sofre uma leve tendência para também ser alta, e vice-versa.
O terceiro mapa é o do PIB per capita (PPP):
Aqui, o coeficiente de correlação, no caso entre religiosidade e riqueza, fica negativo, em -0,50. Isso pode ser interpretado como uma correlação média entre as variáveis, mas com as duas se movendo em direções contrárias: onde a riqueza é alta a religiosidade tende a ser baixa, e vice-versa. Ah, sim: o coeficiente de correlação entre PIB e homicídio também é negativo, mas tem magnitude menor: -0,41.
O quarto e último mapa é o do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), que além de levar em conta o PIB também inclui dados que buscam refletir a qualidade de vida, como educação e saúde:
Neste caso, a correlação entre o indicador e a religiosidade do povo é negativa e forte, com um coeficiente de -0,67. Em comparação, a correlação entre IDH e taxa de homicídio também é negativa, mas de fraca a média, ficando em -0,49.
O problema com correlações é que, na ausência de informações mais detalhadas sobre os elos causais, o máximo que se pode depreender delas é que indicam que A causa B, ou que B causa A, ou que a A e B são, ambos, manifestações de uma terceira variável hipotética, oculta na análise, C.
No caso concreto, pode ser que o baixo desenvolvimento humano estimule a religiosidade; que a religiosidade seja um obstáculo ao desenvolvimento humano; ou que religiosidade e baixo desenvolvimento sejam, os dois, fruto de uma série de condições ainda não especificadas.
Agora, já tendo organizado a coisa toda desse jeito, me parece uma pena não explorar um pouco mais esses dados, e compará-los a outros: PIB e IDH me pareceram as escolhas óbvias, e é deles que tratarei nesta postagem. Antes, porém, vale a pena citar algumas limitações.
A principal ausência -- são 138 países, ante 187 que costumam aparecer nas listagens de órgãos da ONU -- é o Reino Unido (os números do Guardian, baseados no UN Data, quebram os dados de violência em Escócia, Inglaterra, etc.). Mas suponho que se essa ausência vier a provocar alguma distorção nos resultados gerais, ela provavelmente será a favor da hipótese de que a religiosidade é uma força social para o bem: a taxa de britânicos que considera a religião importante é de meros 26,5%, e o país tem tanto um IDH muito elevado (acima de 0,8) quanto um PIB per capita idem (US$ 36.090, PPP). Na semana passada, eu também ainda não tinha o dado de religião da China, mas encontrei o número no Gallup World View e ele está sendo levado em conta, agora.
Outra questão é a disparidade das datas de coleta dos dados usados: os números da pesquisa Gallup são de 2009 (2011, no caso da China), PIB e IDH são de 2011, os números de homicídio vão de 2003 a 2005. Enfim, uma confusão, mas com exceção dos assassinatos, todas as bases refletem, de algum modo, o mundo pós-crise de 2008.
Enfim, aqui abaixo estão os mapas. O primeiro é o da importância da religião -- porcentagem dos entrevistados de cada país que responderam "sim" à pergunta do Gallup, "a religião é importante na sua vida cotidiana?", e onde "1" corresponde a 100%. Os espaços brancos refletem países sem o dado:
A seguir, a taxa de homicídio por 100.000 habitantes:
Uma análise estatística encontra um coeficiente de correlação de 0,34 entre as duas bases de dados -- religiosidade e violência. Tradicionalmente, isso seria interpretado como uma correlação fraca entre as duas variáveis, indicando que quando uma tem valor alto, a outra sofre uma leve tendência para também ser alta, e vice-versa.
O terceiro mapa é o do PIB per capita (PPP):
Aqui, o coeficiente de correlação, no caso entre religiosidade e riqueza, fica negativo, em -0,50. Isso pode ser interpretado como uma correlação média entre as variáveis, mas com as duas se movendo em direções contrárias: onde a riqueza é alta a religiosidade tende a ser baixa, e vice-versa. Ah, sim: o coeficiente de correlação entre PIB e homicídio também é negativo, mas tem magnitude menor: -0,41.
O quarto e último mapa é o do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), que além de levar em conta o PIB também inclui dados que buscam refletir a qualidade de vida, como educação e saúde:
Neste caso, a correlação entre o indicador e a religiosidade do povo é negativa e forte, com um coeficiente de -0,67. Em comparação, a correlação entre IDH e taxa de homicídio também é negativa, mas de fraca a média, ficando em -0,49.
O problema com correlações é que, na ausência de informações mais detalhadas sobre os elos causais, o máximo que se pode depreender delas é que indicam que A causa B, ou que B causa A, ou que a A e B são, ambos, manifestações de uma terceira variável hipotética, oculta na análise, C.
No caso concreto, pode ser que o baixo desenvolvimento humano estimule a religiosidade; que a religiosidade seja um obstáculo ao desenvolvimento humano; ou que religiosidade e baixo desenvolvimento sejam, os dois, fruto de uma série de condições ainda não especificadas.
Fiz uma análise focando no grau de arreligiosidade:
ResponderExcluirhttp://neveraskedquestions.blogspot.com.br/2011/08/ateismo-felicidade-e-desenvolvimento.html
[]s,
Roberto Takata
Aqui tem dados mais atualizados sobre índice de homicídios: http://www.unodc.org/documents/data-and-analysis/statistics/Homicide/Globa_study_on_homicide_2011_web.pdf
ResponderExcluir---------------
[]s,
Roberto Takata
Opa, obrigado!
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