Voo final do Discovery marcado. De novo.



A Nasa decidiu marcar para a próxima quinta-feira o lançamento derradeiro do ônibus espacial Discovery. Dá para acompanhar a contagem regressiva online neste link.

Para quem não se lembra, diretriz dada pelo então presidente George W. Bush em 2004 determinava que a frota de ônibus espaciais dos EUA iria parar de voar em 2010. O Endeavour já fez sua última missão oficial, mas ainda falta aposentar o Discovery e o Atlantis (Challenger e Columbia foram destruídos).

O voo final do Atlantis acabou adiado de 2010 para junho deste ano por conta de mudanças no equipamento científico que a nave terá de levar à Estação Espacial Internacional (ISS), mas o atraso na aposentadoria do Discovery tem uma causa mais embaraçosa: problemas na segurança do tanque de combustível da nave.

De fato, a sucessão de adiamentos na partida derradeira do Discovery é uma espécie de resumo do fracasso do programa de ônibus espaciais.

Vendidos como os veículos que tornariam o acesso à órbita terrestre fácil, rápido e barato -- a ficção científica americana da década de 80 está toda povoada por cidades orbitais, empresas com sede no espaço, ônibus espaciais comerciais, etc. -- eles acabaram se mostrando caros, complexos e inseguros demais.

Da promessa inicial de um lançamento por semana, o programa terá realizado, entre sua estreia em 1981 e seu encerramento, em 2011, 133 voos ao longo de 30 anos, ou pouco mais de 8% da frequência esperada.

Compreensivelmente, as cidades espaciais e as megacorporações orbitais não se materializaram. Na verdade, essas esperanças nunca foram muito mais sólidas do que o projeto de Wernher von Braun de colonizar Marte usando uma frota gigantesca de naves de propulsão nuclear e asas-delta (não estou brincando: leia aqui).

A Nasa, no entanto, passou décadas em estado de negação -- como o marido traído que se recusa a enxergar as provas claras de infidelidade ao seu redor.

Em 1983, por exemplo, um estudo encomendado pela Força Aérea Americana calculou que o risco de um ônibus espacial explodir no lançamento era de cerca de 3% -- um número positivamente aterrador, já que basicamente garantia a ocorrência de um desastre ao ano se fosse mantido o ritmo de um lançamento por semana, como previsto.

Em resposta, a Nasa disse que preferia adotar um "julgamento de engenharia" que punha o risco de explosão no lançamento em 0,001%. Após do desastre do Challenger, o físico Richard Feynman, que tomou parte na investigação da tragédia, disse que "até onde consigo entender, 'julgamento de engenharia' significa inventar os números!".

Comentários

  1. Ainda há, um dia, que se medir o programa espacial como sob o "julgamento dos contratos"... tenho desconfianças de que empresas especializadas no suprimento de sistemas, componentes e materiais do projeto espacial podem não ser realmente o mais saudável para o mesmo - é só ver a simplicidade com que os russos fazem as coisas.

    Mas até aí, tenho cá com meus botões que um programa espacial não é tão diferente de um departamento de obras públicas: tem que ser vistoso e sair caro - eficiência em segundo plano e economia, nem pensar...

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